.

Sky
1996. Mala, café, néon, 90X60X60 cm





La Grande Illusion
1996. Açúcar e néon. Foto: J. Tinker



 


 


Marc Latamie

Por Octávio Zaya


O Trabalho de Marc Latamie

Latamie não adota nem a mística francesa nem a idéia nostálgica de uma cultura ancestral. Entre 1990 e 1992, passou a maior parte do tempo realizando uma série de construções poéticas, juntando alternativamente estruturas cilíndricas de arame com cartas e baldes vazios de metal ou pilhas de pinturas com palavras em néon, em uma forma reminiscente da arte povera. Entre esses trabalhos, Latamie criou um grupo de combinações particularmente interessante que brincava com a idéia do Oceano Atlântico como contêiner e como elo. A partir de 1993, Latamie começou uma série de esculturas utilizando diretamente sua experiência de ter crescido nas plantações de cana-de-açúcar. No entanto, sua utilização do açúcar como meio em obras como Caldera e Sargasses funciona além do seu contexto claro e específico, sugerindo estruturas estéticas e culturais muito mais amplas. Nesses trabalhos, o açúcar é apresentado simplesmente como produto genérico. É apresentado como versátil e ubíquo: tanto pulverizado levemente como em Allibaba, ou em uma montanha de açúcar como em Fantasie (em que segue o padrão geométrico do tapete oriental sobre o que está colocado); ou em forma de torrões, como no cesto metálico de Caravelle.

A série culmina com The Factory, uma instalação que Latamie apresentou no ICA em Londres, no verão passado. No seu trabalho multimídia, ele 'recria' uma cabana dos primeiros trabalhadores das plantações na Martinica, contendo diversos elementos relacionados com a economia e a história da Martinica, incluindo garrafas de rum e um vídeo de um campo de flores de cana-de-açúcar (na verdade, o monte de 150 quilos de açúcar colocado no centro do trabalho foi refinado na Inglaterra). Um grupo de imagens em cibachrome que documenta a situação deplorável em que se encontra a fábrica de açúcar de Trinidad completam a instalação. Na verdade, não há nada especificamente caribenho nesta obra. Poderia muito bem ser relacionada ao status quo de abandono de qualquer outro país em desenvolvimento. Não houve forma de se considerar o trabalho como aspiração a qualquer regime de autenticidade transcendental, nem como ilustração etnográfica ou como pano de fundo cultural romantizado. Na verdade, a desorientadora multiplicidade de contextos em que Latamie coloca o açúcar no seu trabalho enfatiza sua condição de mercadoria, de objeto comercial. A circunstância precisa que a faz ser intercambiável e adaptável. Para reforçar esse ponto, Latamie vem fazendo experiências com alimentos e produtos agrícolas como algodão, cacau, rum e café que desempenham um papel similar em termos econômicos e culturais.

Latamie abre o processo de interpretação transpondo nossa atenção do tráfico histórico desses produtos para uma compreensão da problemática da identidade, suas inter-relações e as dinâmicas da sua elaboração. Dos árabes aos romanos, dos europeus aos americanos, os seres humanos sempre comercializaram e manipularam produtos alimentícios, levando os produtos agrícolas (e também animais e pessoas), de forma intencional ou inadvertida, para muito longe dos seus hábitats originais, tendo às vezes sucesso ou causando repercussões desastrosas em termos culturais e ecológicos. Com base na sua história, Latamie faz perguntas relativas a legados e origens, autenticidade e tradição, privação e readaptação. É difícil imaginar como era a alimentação inglesa ou alemã antes da batata; ou a espanhola ou a italiana sem o tomate; ou a africana sem milho e mandioca. Somos capazes de imaginar a Suíça ou a Bélgica sem chocolate? Ou o Caribe sem arroz, banana e açúcar? No entanto, determinados alimentos são oriundos do hemisfério ocidental (como milho, batata, batata-doce, mandioca, amendoim, tomate e cacau) e tornaram-se produtos alimentícios básicos muito longe dos seus lugares de origem, durante os últimos séculos. Hoje em dia, é praticamente impossível acreditar que, antes da ocupação européia da América, não havia nenhum vegetal cultivado pelos nativos americanos que fosse conhecido na Ásia, Europa ou África; que os hábitos alimentares dos povos das Américas e da África tenham mudado tão radicalmente desde a colonização.

São exatamente essas peculiaridades históricas que atraem o interesse de Latamie. Principalmente, está interessado em explorar as implicações desta complexa rede de condições culturais contemporâneas. Segundo ele "nos principais locais internacionais de troca monetária e de commodities (Paris, Londres, Nova York, Tóquio etc.) as pessoas movimentam diariamente toneladas de mercadorias. É muito mais uma questão de se ter uma conta bancária do que de saber qual é a origem da mercadoria, ou de saber qual é o local de destino. O que me preocupa é a formação da identidade neste tipo de troca e de circulação de produtos".



Cronologia


Nasceu na Martinica, em 1952 e graduou-se em artes visuais e história da arte pela Universidade de Paris, em 1978. Foi conferencista no Museu Nacional de Arte Moderna, de 1977 a 1986, em Paris. Vive em Nova York, Estados Unidos.


Exposições

1996
Kunsthalle Krems, Áustria; Bonington Gallery, Nottingham, Inglaterra.
1995
School of Visual Art, Martinica; Institut of Contemporary Art, Londres, Inglaterra; Palau de la Virreina, Barcelona, Espanha; Fundación La Caixa, Palma de Mallorca, Espanha.
1994
Centro de Arte Moderno, Las Palmas de Gran Canaria, Espanha; Nexus Art Center, Atlanta, Estados Unidos; Saline Royale, Arc et Senans, França.
1991
Ekymose Gallery, Bordeaux, França.
1990
Art Frankfurt, Alemanha.
1989
Ekymose Gallery, Bordeaux, França.
1987
Quai Grand Cargo, Martinica; Ekymose Gallery, Bordeaux, França.
1986
Centre National d'Art Contemporain, Paris, França.
1985
FRAC Champagne-Ardenne, Reims, França.
1984
Gallery Regard, Paris, França.
1983
Gallery Regard, Paris, França.
1981
Centre d'Action Culturelle, Mâcon, França.
1979
Primo Lubiam, Mântua, Itália.


Prêmio

Villa Medicis Ilors les Murs.


Coleções

Musée National d'Art Moderne, Paris, França;
Fond National d'Art Contemporain, Paris, França;
Fond Regional d'Art Contemporain, Champagne-Ardenne, França;
Fond Regional d'Art Contemporain, Franche-Comte, França;
Fond Regional d'Art Contemporain, Martinica.