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From A'Beathu
1995/96. Vídeo-instalação





No Colouring Can Deepen the Darkness of Truth
1992/95. Da série The Country Blooms - A Garden and a Grove



 


 


Alanna O'Kelly

Por Peter Murray


A coragem da convicção

Treze anos atrás, Alanna O'Kelly foi instantaneamente guindada ao reconhecimento no mundo da arte irlandesa na noite de 23 de junho - véspera de São João - quando construiu e queimou um marco gigante ao lado da montanha que fica ao norte da cidade de Dublin. Foi um gesto antigo e moderno ao mesmo tempo, característica da artista. O evento marcou uma ruptura na arte contemporânea irlandesa, que deixou para trás uma tradição confortável e algo provinciana em suas escolas de arte e galerias; o evento, porém, também trazia embutidas memórias profundas de antigos rituais irlandeses de fogueiras acesas durante o solstício do verão, o dia mais longo do ano. Por um lado, sua ação era um depoimento artístico pessoal, pertinente em 1982; por outro, ecoava para séculos passados.

Naquele momento, Alanna não estava sozinha na busca de alternativas para a prática da arte; na realidade, estudou no National College de Dublin, onde a quebra destas tradições já havia se tornado norma, e Joseph Beuys visitou a Irlanda e propôs o estabelecimento de uma escola de arte nas colinas próximas de Dublin. Neste contexto, a ação de Alanna na véspera de São João tem uma qualidade imaginativa e uma coragem que ainda estão presentes hoje. Esta qualidade tem sido repetida tanto em sua arte quanto em sua vida pessoal - ambas estão intimamente ligadas - e foi esta qualidade que a fez representante da Irlanda na 23ª Bienal Internacional de São Paulo em 1996.

A carreira de O'Kelly não tem seguido nenhum padrão preestabelecido. Na realidade, muitas vezes atuou contra a expectativa dos críticos à medida que mudava de uma mídia para a outra, mantendo porém a mesma intensidade em todas as atividades. O fato de ter crescido em uma fazenda em Wexford ainda influencia seu trabalho, dando-lhe um sabor de tradição, assim como uma habilidade de alcançar a essência da vida contemporânea. Depois de terminar o National College of Art, O'Kelly mudou-se para Londres, para a Slade School of Art, onde Susan Hiller e Stuart Brisley foram influências importantes. Sua consciência da política feminista contemporânea e as complexidades das identidades irlandesa/inglesa foram intensificadas. Sua arte se desenvolveu em etapas complexas e superpostas, com instalações com slides, registros em áudio e vídeo, freqüentemente apresentados combinados ou baseados em performances ao vivo.

Além da perspectiva feminina contemporânea, que ela compartilha com outras artistas irlandesas, como Anne Tallantire e Frances Hegarty, O'Kelly dá à sua arte um forte sentido de história e de continuidade da tradição. Em 1984, ela esteve na Inglaterra para dar apoio às mulheres que viviam em tendas do lado de fora da cerca de segurança da base da força aérea americana em Greenham Common, em protesto contra a existência de mísseis nucleares em território do Reino Unido. Atuando novamente na direção dos antigos rituais irlandeses, O'Kelly utilizou-se talvez da única forma de defesa que pode ser usada contra armas de destruição em massa: a voz humana. Há muitos séculos as mulheres tinham um importante papel nos funerais irlandeses, cantando, 'entoando' um lamento sem palavras pelos mortos. Ao fazê-lo elas também estabeleciam uma ligação com as origens cicládicas das comunidades da costa oeste da Irlanda. De acordo com esta tradição, O'Kelly criou Chant Down Greenham, em que os sons de protesto e os cânticos repetitivos são misturados com sons produzidos por uma performance ao vivo, que também incorporou fitas de áudio e projeções de vídeo. O som continua a ser elemento central de seu trabalho e freqüentemente suas performances e vídeos começam apresentando somente sons, com imagens introduzidas posteriormente.

Os trabalhos mais recentes da artista continuam a explorar questões políticas contemporâneas e históricas. Uma fotomontagem realizada em 1990, que faz parte de uma série denominada The Country Blooms, a Garden and a Grave, é composta de seis fotos coloridas. As imagens são paisagens inócuas de verdes colinas e terra às margens de rios, mas textos sobrepostos contam uma triste história do tempo em que a fome estava no auge na Irlanda, em 1840, e transmitem ao espectador o forte envolvimento emocional da artista com esse momento da história de seu país. Outra peça desta série, No Colouring Can Deepen the Darkness of Truth, usa três monitores sincronizados e uma rica trilha sonora com músicas e sons plenos de dor, nos quais a dissolução atua tanto como metáfora quanto como técnica.

Como mãe, O'Kelly não separa a família de sua arte. Em todos os seus trabalhos, ela monta seus projetos transformando-os em dignos momentos de experiência humana, verdades cujas raízes se encontram na intuição cultural da própria artista e que se estendem e são válidas para uma multiplicidade de épocas e de culturas diferentes. Por meio de imagens e sons, de gestos e histórias, O'Kelly criou um trabalho novo para ser apresentado na 23ª Bienal Internacional de São Paulo.



Cronologia


Nasceu no Condado de Wexford, Irlanda, em 1955. Graduou-se no National College of Art and Design de Dublin e mais tarde estudou em Helsinque e na Slade School of Art de Londres, onde desenvolveu um trabalho de pesquisa na qualidade de assistente honorária de pesquisa, entre 1985 e 1987. Tem apresentado seu trabalho e realizado palestras em faculdades de arte européias e norte-americanas. Vive e trabalha em Dublin.


Exposições individuais

1996
A'Beathú, instalação com técnica mista com vídeo e som.
1992
The Country Blooms - A Garden and a Grave, Irish Museum of Modern Art, Dublin, Irlanda.
1987
Four Performance Artists, Pentonville Gallery, Londres, Inglaterra.
1985/87
Chant Down Greenham, performance, Estados Unidos e Canadá, e Royal Hospital, Kilmainham, Dublin, Irlanda.
1985
Hear Ye, arte postal de Doilín, para Londres, Inglaterra.
1981
Barries, Project Arts Centre, Dublin, Irlanda.
1979
A Wheel in Motion, organizado por The Arts Council of Northern Ireland and The Roe Valley Country Park.
1978
Nine Works in Nine Weeks, documentário em vídeo sobre escultura feita com materiais indígenas em fazenda de Co Wexford.


Exposições coletivas

1996
Two Women Show, Museum of Art, Gave, Suécia; Imaginaire Irlandais, Beaux-Arts, Paris, França.
1994
IMMA/Glen Dimplex Artists Awards Show, IMMA Dublin, Irlanda; Hors Limites, Centre Georges Pompidou, Paris, França.
1993
Moviola/Video Positive, Walker Gallery, Liverpool, Inglaterra.
1991
Available Resources, Orchard Gallery, Derry, Estados Unidos.
1990
Irish Art/The European Dimension, RHA Gallery Dublin, Irlanda.
1988
A Sense of Ireland, Riverside Londres, Arnolfini Bristol, Inglaterra; Feminalle, festival de vídeo e cinema, Colônia, Alemanha.
1987
Woman's Caucus of the Arts, Boston, Estados Unidos; A Sound Performance, Franklin Furnace, Nova York, Estados Unidos; Documenta 8, Kassel, Alemanha; Off the Map, Chisenhale, Londres, Inglaterra.
1986
Forbidden Heroines, collaborative work A.V.E., Arnhem, Holanda; LVA Channel Six, Londres Film-makers Co-op, Londres, Inglaterra.


Prêmio

1994
Irish Museum of Modern Art/Glen Dimplex Artists Award.